quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Every Breath, Ellie Marney


Opinião: Este livro foi tão… fofo e adorável e excitante e devorável e divertido. O que é que se passa com as autoras australianas para me deixarem completamente louca? Bem, australianas (Jessica Shirvington ao palco, por favor, vem lá fazer companhia à Ellie Marney) e neo-zelandesas (Juliet Marillier, não penses que te escapas). Ou seja, alguém nos (quase-)antípodas anda a pôr alguma coisa na água que faz estas pessoas escreverem coisas que me deixam animadíssima. É a única explicação.

Contudo, isso não interessa nada. O que interessa é que nem o livro tinha acabado - estava naquele final stressante de fazer roer as unhas, na verdade - e eu já me estava a lamuriar pela sequela. Nem consegui esperar pelo fim do livro para começar a suspirar por esse momento longínquo em que porei as mãos no Every Word (a dita sequela)… estamos bem, estamos.

Suponho que devia começar pelo início. Ou pela parte mais distintiva para quem não o leu, que é a comparação deliberada com o cânone Sherlockiano. Suspeito que seja difícil equilibrar as referências a uma personagem tão icónica sem afogar a própria história, mas a Ellie Marney consegue vencer esse desafio, limitando-se a espalhar uma pitadinha ou outra de referências, e deixando os seus personagens e a sua história falarem por si próprios.

Aliás, ela lida com isto bastante bem. Esta história passa-se no mundo real, o nosso mundo, o Arthur Conan Doyle existiu, e escreveu sobre um detective chamado Sherlock Holmes, e os nossos protagonistas estão familiarizados com os mesmos. O que quer dizer que pegam nisso e na ligeira semelhança de nomes e circunstâncias para brincar que são o Watson e o Holmes um do outro, mas sem ficar fixados nisso. Suponho que a "coincidência" os inspirou a meterem-se a investigar um crime, mas é só até aí que o cânone se intromete na história.

Gosto muito da narradora, Rachel Watts, porque é inapologeticamente ela mesma. A família perdeu a quinta para o banco e tiveram de se mudar para a cidade; mas a Rachel ama o campo, e morre de saudades, e passa um bom bocado furiosa com a situação. Contudo, isso não a cega, não a impede de fazer amizades, de fazer a sua vida ali, e de eventualmente aceitar que a cidade também tem os seus atractivos (e um deles chama-se James Mycroft, ehehe). É corajosa e discreta, responsável e portadora duma boa dose de bom senso, o que dá sempre jeito.

Já o protagonista masculino, James Mycroft, é feito dum molde diferente, assombrado por uma tragédia familiar envolta em mistério - a morte dos pais num acidente de carro difícil de explicar. Isso acaba por dirigir a maneira como ele vive a vida. Por um lado um certo sentido auto-destrutivo, bem adolescente, bem centrado em si mesmo, sem vandalizar ou meter os outros em sarilhos. Por outro lado, um lado criativo brutal, em que canalizou a tragédia pessoal para um interesse por química, ciência forense e criminalidade, publicando artigos informativos online. É um personagem interessante de explorar, e senti compaixão pelo seu percurso de vida, porque é basicamente um miúdo negligenciado, desde que perdeu os pais, e que nunca teve rumo, mas que exibe alguma maturidade invulgar devido às suas circunstâncias.

Agora, a parte melhor do livro… são os dois juntos. Para já porque fazem um belo par de detectives, sempre a meter-se em sarilhos e determinados a resolver o mistério do livro. Depois, porque têm uma química e um entendimento mútuo inegável, e é fascinante vê-los juntos. Basicamente conhecem-se há quatro meses e meio e lidam um com o outro como se se conhecessem há uma vida inteira. (O que me lembra, matava para ler sobre como se conheceram e se tornaram amigos. Há de ser uma história divertida, imagino.)

E por fim, porque a química e a tensão estão lá, e acho que até eles estão cientes disso, apenas levam muito tempo a decidir fazer alguma coisa, o que é em parte torturante e em parte delicioso. E pronto, esta conjunção de características dos personagens e da sua relação fez-me torcer por eles como se não houvesse amanhã.

O mistério apresentado na história é complexo o suficiente para manter o interesse, e simples o suficiente para ser credível que um par de adolescentes consiga resolvê-lo, suponho. O vilão principal não é completamente óbvio, mas também não é difícil de adivinhar, apesar de as suas motivações me deixarem na dúvida. Existem tipos destes? *arrepio* Achei bem mais realista o vilão secundário, que é aquele que acaba por impelir a narrativa, e que tem os motivos mais credíveis.

Acho que a equipa Watts-Mycroft teve uma sorte brutal ao descobrir um certo pormenor, porque nada lhes dizia que aquilo tinha alguma relação com o crime, a não ser um palpite que se revelou certeiro… mas de resto, a investigação é feita com os recursos que têm à mão, que não são muitos, e com uma bela dose de engenho adolescente bem engraçado (e às vezes perigoso).

O elenco de personagens secundários dá um bom suporte à história, e não houve ninguém que não me deliciasse conhecer. A Mai e o Gus, amigos dos protagonistas (e fãs número 1), que os incitam na investigação. A família da Rachel, cujas tensões presentes pela mudança para a cidade são bem credíveis. Até o Dave, o sem-abrigo que morreu e que era amigo do Mycroft e da Watts.

E também o Detective Pickup (este nome é hilariante por alguma razão) e o Professor Walsh, que imagino que venham a aparecer no futuro, provavelmente a cruzar-se novamente com o Duo Dinâmico numa investigação. Oh, e o director da escola, Conroy, porque tenho quase a certeza que é um fã do Mycroft, apesar de ter de lidar com demasiadas confusões armadas pelo Mycroft. Coitado do homem.

A escrita agradou-me, por ser bem humorada mas não fugir a abordar aspectos menos felizes, por ser realista e criar um par de adolescentes credíveis, nem demasiado maduros, nem demasiado infantis. É uma altura da vida complicada, em que não se é nem carne nem peixe, e encontrar o equilíbrio a escrevê-la não é fácil. Além disso, diverti-me a descobrir os coloquialismos Australianos. São palavras e expressões que são fáceis de perceber pelo contexto, mas que são usadas de novas maneiras, e isso ajudou-me a imergir no cenário.

Enfim, estou a escrever isto e a dar-me conta como às vezes tenho uma sorte macaca e fantástica, por as estrelas ou os planetas se alinharem, ou coisa parecida, e um livro conseguir juntar e conjugar uma série de coisas que separadas me agradam, mas que juntas me deixam felicíssima da vida, e tremendamente entusiasmada; e ao mesmo tempo desgostosa porque, pronto, lá fiquei viciada em mais uma série, e enfim, o que é mais um bocadinho de sofrimento pelo próximo livro de uma série? Não é nada a que eu não esteja habituada, e sempre tenho outros livros de outras séries para me entreter pelo meio.
Páginas: 352

Editora: Tundra Books (Random House)

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